Como se ensinava a escrever aos escolares (com “encarregado do chicote”) |
Luis Dufaur
Escritor, jornalista,
conferencista de política internacional, sócio do IPCO, webmaster de diversos blogs |
O que experimentaram os descendentes de Adão e Eva neste vale de lágrimas nos tempos após a expulsão do Paraíso? Como educavam a seus filhos? Fundaram escolas? Em caso positivo, como funcionavam?
Escavações arqueológicas na Mesopotâmia trouxeram à luz centenas de milhares de textos em escrita cuneiforme que nos ilustram sobre a escolarização das crianças há muitos milênios.
Muitos dos achados têm interesse apenas para especialistas: registros de impostos, listas de mercadorias, correspondência diplomática etc., e não atendem nossas perguntas.
Escritura cuneiforme suméria |
Os textos são fascinantes porque nos revelam a vida da humanidade na alvorada da história, com anseios e preocupações surpreendentemente semelhantes aos atuais, segundo matéria publicada pela “Folha de S.Paulo”.
E nos fazem descobrir que eles tinham basicamente as mesmas preocupações que nós temos. Sim, os descendentes próximos de Adão e Eva se mostram muito parecidos conosco e nós continuamos muito parecidos a eles.
O evolucionismo e histórias de gênero de que o homem descende do macaco ficam reduzidos a lorotas lendo essas descrições de quatro ou cinco milênios atrás, trazidas a luz pelos cientistas.
Nos textos a que nos referimos foram recuperados na Suméria, a mais antiga civilização conhecida, estabelecida no sul da Mesopotâmia, sul do Iraque atual, onde a escrita foi inventada, bem antes de tomarem corpo as famosas cidades bíblicas de Babilônia, Nínive e Ur na mesma área geográfica.
Os cientistas desvendaram a primeira versão escrita do dilúvio universal, a primeira receita de cerveja, as primeiras fábulas com animais, o primeiro uso da palavra humanidade (namlulu, em sumério), até a primeira canção de amor e o primeiro relato de delinquência juvenil.
Esse último pode ter sido um “best-seller” na Suméria, pois foram encontradas mais de 20 cópias, e fala da vida de um estudante por volta de 2.500 a.C..
A alfabetização feita pela Igreja não dispensou o disciplinário. Aula, iluminura de 'Liber ethicorum des Henricus de Alemania'. Kupferstichkabinett, Berlim |
Cada escola era dirigida por um professor com o auxílio de um assistente, que redigiam textos para os alunos copiarem e assim aprenderem a escrever, ensino, aliás, muito descuidado na nossa época.
Também havia profissionais escolares especializados: o “encarregado de desenho”, o “encarregado de sumério” (a língua), e até o “encarregado do chicote” para por ordem nos indisciplinados!
O currículo era centrado na leitura e na escrita, mas também incluía línguas estrangeiras e matemática.
Um dos mais antigos escritos da Humanidade achado na Suméria |
Mas ao longo do tempo essas escolas evoluíram para se tornarem centros de produção de conhecimento e de criação literária.
Mal pagos (até isso não mudou muito em milênios), professores e assistentes viviam famintos e mal-humorados.
O herói da novela citada suplica a seu pai:
“convida o professor a comer na nossa casa, senta-o no lugar de honra à mesa, dá-lhe um bom jantar com vinho, e veste-o com uma túnica nova, pois eu não aguento mais apanhar”.
Feliz com a refeição e os presentes, o mestre aprova o estudante dizendo:
“Jovem, já que atentaste para meus ensinamentos, estou certo de que terás carreira brilhante, serás exemplo para teus colegas e braço direito de teus chefes”.
A cena ate que poderia ter acontecido em nossos dias onde quiçá não se premia devidamente a merecida importância e respeitabilidade do mestre da escola.